Tantra e Terapia Corporal
O Tantra pode ser uma terapia corporal? Existe algo que podemos chamar de “Terapia Tântrica”?
A intenção deste texto é jogar luz sobre esses questionamentos.
O que é o Tantra?
Tantra, ou Tantrismo, é uma tradição esotérica com suas origens na atual Índia e Caxemira. De maneira mais estruturada, como um movimento cultural, o Tantra surge aproximadamente nos anos 500 dc, mas há evidências de ideias da tradição tântrica em ensinamentos bem mais antigos.
Tantra é um termo que tem muitos significados e sentidos. Pelo seu sentido etimológico, Tantra pode ser entendido como sendo um “instrumento para expansão”. Mas temos adotado na Kaya Terapias a adoção do entendimento de que Tantra é um “caminho de expansão e libertação, sempre em interconexão com todas as formas de vida e toda a existência que nos rodeia e nos preenche”. Por este motivo o Tantra é entendido como sendo um “caminho de união com o todo”.
Gostamos também de dizer que o Tantra é um “caminho de autoconhecimento e expansão da consciência que utiliza o corpo, a energia e a sexualidade como ferramentas para o despertar espiritual”. Ele engloba práticas que vão desde meditação e respiração até rituais sagrados e de conexão.
O que é o NeoTantra?
A chegada do Tantra ao Ocidente se deu no Século XX, a partir de movimentos feitos por acadêmicos britânicos que pesquisaram a fundo as tradições espirituais da India durante o período da colonização daquele país pelo Império Britânico. Dali saíram publicações que traziam relatos e entendimentos sobre a cultura tântrica vinda a partir do Hinduísmo. Por outra vertente, o Tantra Budista chegou até o Ocidente a partir de movimentos feitos por lamas budistas, que temiam o desaparecimento dos ensinamentos a partir da Revolução Chinesa de 1949, liderada por Mao Tse Tung, que ocupou o Tibete e o Nepal, e proibiu qualquer manifestação religiosa ou espiritual naquele território ocupado - vide a necessidade de fuga do Dalai Lama do Tibete.
Aqui no Ocidente, vivíamos os desdobramentos dos ensinamentos de Freud, que deram espaço ao surgimento de Reich e sua abordagem corporal. Freud trouxe o entendimento seminal da relação entre sexualidade e psique, explicando a formação da personalidade a partir dos impulsos sexuais. Wilheim Reich, que foi seu aluno e depois colega de trabalho, explorou mais a fundo essa relação, mas escolhendo seguir pelo caminho corporal. Reich teorizou, demonstrou e desenvolveu uma abordagem que identifica como a repressão dos impulsos de vida acontece no corpo sob influência dos elementos culturais altamente repressores da expressividade humana. Assim, atuamos para conter a expressão das nossas emoções e para controlar a experiência com o prazer, gerando tensão, contenção da expressividade e perda da espontaneidade.
A partir da metade do Século XX, ganharam notoriedade trabalhos terapêuticos que davam continuidade aos ensinamentos de Reich, e adicionavam novos elementos. Dentre vários, podemos citar a Bioenergética (Alexander Lowen), o Core Energetics (John Pierrakos) e o Radix (Charles Kelley).
Estes terapeutas especificamente não se relacionam com a abordagem do Tantra, mas vários de seus alunos tiveram acesso aos conhecimentos do Tantra, especialmente o trabalho com as meditações ativas desenvolvidos pelo Mestre Osho em seu Ashram em Poona, na Índia. Destes encontros, foi surgindo uma abordagem terapêutica que colocava em diálogo a abordagem inspirada nas práticas e ensinamentos tântricos e aquela inspirada nos caminhos energéticos corporais tipicamente ocidentais. Estavam criadas as condições para o surgimento do NeoTantra.
O NeoTantra traz a ideia de se trabalhar a sexualidade e o potencial energético humano, com desdobramentos nos comportamentos, na integração mente-corpo e na conexão espiritual. Nesta abordagem, entram em cena elementos que vêm do Xamanismo, dos trabalhos com as meditações ativas, das técnicas de respiração consciente e das técnicas de massagem corporal - especialmente a massagem tântrica. Há inspiração nos saberes comportamentais do Tantra, mas sem os elementos do Tantra Clássico, que tem características mais ritualísticas, devocionais e baseado em escrituras sagradas. No NeoTantra, o participante é muito mais um aluno em um processo educacional, diferente do praticante do Tantra Clássico, que pode ser caracterizado como um discípulo em um processo de iniciação.
A terapêutica tântrica
Surge então no final do Sèculo XX e início do Século XXI um termo “guarda-chuva” para designar a junção de práticas terapêuticas corporais que se inspiram na abordagem corporal de Reich, na abordagem de alguns psicólogos humanistas e na abordagem do NeoTantra. Este termo é a Terapêutica Tântrica.
Essa combinação oferece um caminho terapêutico para se aprofundar no trabalho com a energia vital, a sexualidade e a liberação emocional. Reich já havia identificado a repressão sexual como a base de muitas neuroses e enfatizava a importância da respiração, do movimento e da liberação das couraças musculares para restaurar o fluxo energético do corpo. O NeoTantra, por sua vez, oferece uma visão não-dual e integrativa da sexualidade, vendo o prazer e a energia sexual como potenciais de transformação e expansão da consciência. Assim, muitos terapeutas ocidentais passaram a incorporar práticas tântricas como respiração consciente, toques sutis, meditações ativas e trabalho energético para desbloquear traumas e permitir uma conexão mais plena entre corpo, mente e espiritualidade.
Então, o que podemos dizer é que existe sim um percurso terapêutico corporal NeoTânrico. Este percurso é poderoso naquilo que se propõe, e está em franca disseminação no contexto ocidental, tendo o Brasil como um dos líderes neste movimento. O Tantra Clássico tem uma incidência insignificante em termos de número de seguidores e praticantes, apesar de ser relevante como caminho espiritual!. Talvez isso se explique por ser um caminho fortemente vinculado a tradições espirituais, costumes, linguagem e contexto bastante distantes da nossa realidade ocidental - onde há predominância da tradição judaico-cristã, do uso da ciência, da cultura latina e anglo saxã. Portanto, essa pouca incidência de praticantes do Tantra Clássico acabou abrindo caminho para que os termos “NeoTantra” e “Terapêutica Neotântrica” fossem ocupando este espaço, sendo simplificados para “Tantra” e “Terapêutica Tântrica”.

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